TABUS E MEDOS
Nasci em um sitio de pé de serra denominado Belmonte, aqui no Crato-CE. Meus pais eram singelos agricultores, tementes a Deus, e não arredavam uma vírgula das informações que lhes eram passadas pelos sacerdotes do seu tempo. O que eles aprenderam foi o que nos repassaram no decorrer dos anos.
Quando eu tinha cerca de dez anos fiquei sabendo por terceiros, que no último dia da semana santa, sábado de aleluia, deveria haver uma missa a meia noite, e somente poderia ser celebrada se os padres, folheando todos os livros da igreja encontrassem uma gota de sangue, o sangue de Cristo entre as páginas de um deles. Por isto as portas ficavam cerradas. Quando o sangue era encontrado, os sinos tocavam alegres e as portas eram abertas ao público.
O meu medo era que não encontrassem a gota de sangue, pois fiquei sabendo que se não fosse localizada, o mundo acabaria naquele ano. Então nessas noites eu não conseguia pregar o olho até ouvir o sino tocar a meia noite.
Com o passar dos anos, fui crescendo, mas sempre temeroso de um dia o mundo acabar no ano em que não encontrassem aquela gotinha de sangue. Aquilo não me saia da cabeça. Mais algum tempo e fui autorizado a ir à missa do sábado de aleluia. Então me plantava na calçada da Sé Catedral ouvindo o barulho interno sem nada poder ver, e ficava também de olho no grande relógio da matriz, doido que chegasse a meia noite e que os padres encontrassem a tão esperada gota de sangue.
O leitor na idade atual e que não passou pelos tempos negros dos tabus religiosos, não pode imaginar o que se passava na cabeça de uma criança. E naqueles tempos a gente não podia conversar com os adultos sobre essas coisas, pois eles saiam com evasivas, talvez por que também não soubessem explicar como acreditavam nessas coisas. O padre estava certo e ponto final.
Quando se aproximava esse tempo, eu perdia o apetite e ninguém me fazia comer coisa alguma. Às vezes me escondia para não conversar com ninguém, e até temia tocar no assunto.
É... Fui um garoto irrequieto, mas cheio de temores e traumas, mas não culpo os fundamentos da religião por isto. Naquele tempo era o que podia ser ensinado.
Lembro-me de 1957 quando falaram que em 1960 haveria três noites de escuro, e durante a escuridão a maior parte da população mundial morreria.
Pois bem, sofri durante os três anos seguintes e passei meses sem me alimentar direito. Era horrível ser criança e não poder falar com os adultos sobre nossos temores. Talvez eles tivessem me ouvido e me orientado. Mas eu temia demais falar sobre o assunto quando cheirava a morte.
Por motivos religiosos e pelos tabus pregados como verdades, sofri muito na minha infância, juventude e adolescência. Se estou aqui narrando para vocês é por que sei que muitos também passaram por coisas semelhantes e como eu, certamente deram a volta por cima sem armazenar traumas.
Cada um tem a sua história.
Qual é a sua?
Escrito por Vicente Almeida
07/04/2012
Não exatamente medo mas tenho muitas lembranças e algumas dúvidas que talvez você possa esclarecer. Eu fui criada em frente a uma igreja e passei a minha infância ouvindo a missa ser rezada em latim. Não entendia nada, muito tempo depois fui monitora de Latim pela facilidade com que aprendi nossa língua materna que hoje é uma língua morta. Medo eu tinha dos penitentes, estranhava também a matraca. Lembro da cerimônia do lava pés. Estranhava o jejum e ainda hoje estranho....as pessoas fazem verdadeiros banquetes, trocam ovos de Páscoa por ser a SEMANA SANTA. Meus pais participavam ativamente da programação e eu fui acostumada nesse meio. Estranhava a confissão mas não podia discordar de meus pais...contar seus pecados ao padre e depois ter que rezar pagando esses pecados. Se você entendeu o que quero saber, por favor, responda, Vicente, vou adorar. Ah! Parabéns mais uma vez pelo belo texto que está enriquecendo nosso blog.
ResponderExcluirAbraço Fafá
Amigo Vicente Almeida
ResponderExcluirAté chegar aos 16 anos de idade sempre convivendo no nosso interior caririense, passei também por "Medos e Tabus" principalmente na época da Semana Santa, pois fomos educados para obedecer e respeitar os mandamentos de nossa Religião Católica.
Gráças a Deus não me arrempendo.
Abraços e Feliz Páscoa !
Carlos Airton
... Aí eu disse:
ResponderExcluirFátima Bitu:
Convivi na minha infância com muitos tabus de ideologia religiosa.
Não entendia, nem aceitava, mas tinha que ficar calado. Menino não podia contestar as palavras dos mais velhos, e se fossem de um padre, ai seria sacrilégio duvidar.
Foi assim que me passaram muitas informações assustadoras sobre religião, o futuro da alma e o inferno.
Passei a contestar esses mitos e tabus a partir de 1961, quando decidi entender religão sem as tradicionais informações dogmáticas. Eu queria a verdade.
Também assisti muitas missas em latim, via apenas o padre de costas e os seminaristas que tocavam a campainha determinando o momento de se ajoelhar, sentar ou ficar em pé, mas eu era tão pequeno que não me ligava ao seu conteúdo, entretanto sempre acompanhava meus pais.
Minha mãe nunca me deixou ver um penitente. A informação que tinha era de que eles se auto flagelavam e era proibido menino ver.
O Jejum foi outra coisa que não entendia. Ao se aproximar a semana santa, em nossa casa apareciam muitas pessoas pedindo ajuda para quebrar o jejum. Oxente se era para fazer jejum, por que quebrar?
Durante a semana santa não era permitido comer doces de forma alguma. Hoje a maior fonte de renda das lojas na páscoa são os ovos de chocolate. Oxente, que tradição é essa?
Confissão. É... Me confessei inúmeras vezes, e até mesmo depois de casado. Na minha juventude, havia uma história de que quem se confessasse todas as primeiras sexta feiras durante nove meses, tinha a salvação garantida. Fui na onda!
Olhe: Vale a pena ser cristão, não importa o credo religioso que venhamos a adotar. O importante é que Deus estará sempre presente em nossas vidas.
Todas as religiões do mundo têm seus preceitos a ser seguido, então quando adotamos uma, consequentemente aderimos aos seus ensinamentos, embora não concordemos com alguns.
Sou cristão fervoroso, agora ainda não sei se sou catélico ou evangólico. É o mesmo que sair da frigideira para a agua fervente.
A única coisa que sei de verdade é que precisamos adotar uma religião para nortear nossa vida cristã.
Não sei se respondi seu questionamento ou aumentei suas dúvidas.
A única certeza que tenho é que somos caririenses, amigos (os 3), fomos criados cheios de medos e tabus e agora já amadurecidos ainda não encontramos resposta para nossas dúvidas e/ou questionamentos. O importante é que nossos pais tiveram a melhor intenção em nos educar como tal. Cabe a cada um assimilar ou não. Meu pai foi mariano, minha irmã foi catequista, participei da cruzadinha e hoje tenho saudade de tudo isso. Não cabe a mim contestar os valores incutidos por meus pais mas há muita contradição. Apesar de tudo, serei sempre catolica.
ResponderExcluirConcordo com Vicente quando diz:" A única coisa que sei de verdade é que precisamos adotar uma religião para nortear nossa vida cristã." Parabenizo Vicente pela brilhante idéia de nos fazer dialogar assim. É muito importante para o blog.Gostei da resposta aos questionamentos.
Carlos, achei muito pertinente sua postagem quando diz que fomos educados para obedecer os mandamentos de nossa religião.Voltem sempre!
Fafá Bitu
É Vicente, cada um de nós tem uma história diferente em nossas vidas. Eu também tenho a minha ou as minhas. Sou catélico, segundo sua inteligente classificação. busco através desta opção
ResponderExcluirreligiosa aprimorar dia a dia a minha existência e caminhar olhando sempre para o nosso DEUS único. Conhecí gente e no meio desta gente, um cidadão que pertencia ao SENHOR, muito me infuenciou na vida, Ele se chamava Pompílio, que do fundo de sua existêbcia de pobreza econômica mas de grandes virtudes, arrancou e me ofertou honestidade e sabedoria ,juntmente com meus Pais. É poristo que vez outra estou a citá-lo em meus rabiscos. Esta é uma de minhas histórias,simples demais,contudo pura e fiel
João Bitu
arrancou muita sabedoria para m