12 de maio de 2011

MOMENTO DA PROSA - Por Claude Bloc

Vida Viajante
-  Claude Bloc -

Fortaleza (clique para ver em tamanho maior)

Não lembro onde li esta frase:”Viajar cura a melancolia”. Creio que, a partir daí, fiz disso um lema, porque acreditei no que li. Eu tinha fases de apatia. Não de depressão, mas de recolhimento. Recordo apenas a impressão que esta frase me causou. Imaginei viagens. Viajei com a poesia. Viajei. Pendurei momentos como esses pelas esquinas do mundo e do tempo e me deixei absorver por esse ensaio de cura. Cura da melancolia.

Os anos se passaram, apagaram-se muitas estrelas na minha vida e, ainda hoje, não sei se viajar realmente é uma cura. No entanto, persiste em mim aquela curiosa impressão de que a frase que li naquele momento foi pura predestinação.

Na verdade, desde então, nunca mais parei de viajar. E a vida foi se pontuando de oportunidades. Até atravessei o país... Fui morar no Rio por oito meses, morei no interior de São Paulo por mais de seis anos e em pensamento me perdi entre mares e desertos, mudei de casa não sei quantas vezes e conheci a poesia mais de perto, perdida na vasta noite da inspiração... Avancei sempre, sem destino certo, tantas e tantas vezes. Mas... com certeza, sempre quis estar de volta aqui, ao Cariri.

O que sei, porém, é que tudo começou nesse dia. Era ainda noite fechada e eu estava na Serra Verde.  Levantei-me e parti em busca de respostas. Fui em direção ao açude Segui a rebentação daquelas ondinhas ali pela margem, apanhei seixos e búzios, contornei a parede do sangradouro; afastei-me de casa o mais que pude. O sono não chegava. Acompanhei a trajetória da lua refletida nas águas. Vi a manhã erguer-se, branca, e envolver o Alto do Caboclo; vi, tudo isso também em outros dias: crepúsculos e noites sobre aquele espelho... e amei a existência com todas as minhas forças.

Nessa noite, adormeci ali, onde calhou: no meio daquela areia granulosa, enroscada em meus próprios braços, como um animalzinho indefeso... Quando regressei, regressei com a ânsia de uma eterna viajante dentro de mim.

Hoje sei que não consigo parar de me locomover prá lá e prá cá. Quantas e quantas cidades conheci assim? Perdi a conta. E aprendi que o/a viajante ideal é aquele/a que, no decorrer da vida, se despojou das coisas materiais e que viaja mesmo quando executa as tarefas quotidianas. Que posso viver mesmo sem possuir muita coisa, mas nunca sem adquirir meu próprio modo de vida.

É assim que tento conduzir a vida: caminhando, com a leveza de quem abandonou tudo aquilo que nada lhe acrescenta. E viajo sempre deixando o coração apaixonar-se pelas paisagens enquanto a alma, no puro sopro dessa caminhada, se recompõe das aflições da cidade.

E foi também dessa forma que, pouco a pouco, aprendi que vejo as coisas de forma diferente do que outros viajantes veem, ao passarem pelos mesmos lugares. Acredito que o olhar de cada um, sobre as coisas do mundo, é único.  

Se viajar, não cura a melancolia, pelo menos, percebo que purifica a alma. Traz ao passageiro desta vida a paz de espírito; e deste modo, o corpo reencontra a harmonia perdida - entre o homem e a terra.

Dessa forma tornei-me nômade: ao saber que não fui feita para ficar quieta. Ser sedentário/a me empobrece, mata-me a alma, estagna meu pensamento.

Por tudo isto, como viajante, escolhi caminhar nessa linha. Nela eu canto, escrevo, vivo. Sou uma fagulha que viaja nesse Universo. 

Claude Bloc

2 comentários:

  1. Maravilhoso texto, Claude. Quanta profundidade! Quanta leveza! A sabedoria vestida em impecável forma. Parabéns!

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  2. Os textos da Claude mexem com a gente, Paulo. Ela consegue nos tocar com tanta leveza que nos deixa embevecidos. Estou feliz de ver vocês esbanjando sabedoria aqui na minha casinha virtual.Voltem sempre,
    Fafá

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