- A senhora tem de dormir, vovó! Tome, ao menos, este comprimido!
- Não quero! – Falava, com segurança, dona Francisca. – Pois vou ter que lhe levar ao médico para uma consulta. Não existe outra solução, já que a senhora se recusa a tomar qualquer calmante.
Dona Francisca era a esposa de seu Manuel, recém-falecido de câncer de mama, neoplasia, que apesar de rara no sexo masculino, existe. Ele, como ela, também tinha pavor a médicos e a medicamentos. Recusara-se, até o último momento de sua vida, a procurar um serviço de saúde para tratamento especializado. Neste caso, a família também foi conivente diante de tão importante decisão.
Dia seguinte, a agente comunitária de saúde conduz o médico para uma visita domiciliar na casa de sua avó. Dona Francisca, já trocada e sempre choramingando, conversa com o profissional de forma monossilábica. Os sintomas variavam de uma vaga tristeza até crises fortes de choro, passando por desilusão e falta de vontade para viver. Não ia mais à missa, nem tampouco participava das reuniões sociais, que antes gostava tanto no seio de sua pequena comunidade rural.
O médico, após conversa reservada com outros membros da família, descobriu que a vida naquela residência estava muito desregrada. A matriarca não dormia, nem permitia o sono tranquilo dos outros. Chorava o tempo todo e já começava a verbalizar ideias suicidas. Não restava outra opção, senão tratar de forma medicamentosa e com dosagens fortes de remédios aquela descompensada depressão.
- Até breve, dona Francisca. – Bradou o médico após preencher o receituário com uma medicação para tratar aquele mal que tanto maltrata as pessoas, deixando-as melancólicas e chorosas.
Três semanas depois, tempo necessário para que a medicação alcançasse o seu efeito máximo, o esculápio volta àquela casa para rever a sua paciente, apesar de já ter sido avisado da grande melhora alcançada com a sua prescrição.
- E aí, dona Francisca, está se sentindo melhor? Já fui informado que parou de chorar e que já ensaiou algumas gargalhadas. Fiquei muito feliz com o resultado do tratamento.
- É verdade, doutor. Aquela tristeza que eu sentia, eu não sinto mais. Porém, quero que o senhor suspenda, imediatamente, toda a medicação, pois não vou tomar mais nenhum comprimido.
- O médico, sem entender, indaga. – Mas por que, minha senhora?
- É que o senhor passou um remédio para eu esquecer o meu falecido marido. E eu não quero isso para mim!
- Ao médico, restou apenas o consolo de mais uma história pitoresca para a sua coleção.
Parabéns, me comovi com essa, abraço Fafá
ResponderExcluir