30 de outubro de 2011

José - Carlos Drummond de Andrade


 
JOSÉ


E agora, José?
A festa acabou  
a luz apagou
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José
e agora, Você
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta
quer morrer no mar
mas o mar secou
quer ir para minas
minas não há mais
josé e agora?
se você gritasse
se você gemesse
se você tocasse
a valsa vienense
se você dormisse
se você cansasse
se você gemesse
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
sozinho no escuro
qual bicho do mato,
sem teogonia
sem parede nua
para se encostar
sem cavalo preto
que fuja a galope
você marcha José
José, para onde?
(Carlos Drumond de Andrade)




2 comentários:

  1. É...

    Fafá:

    Este poema é dos mais belos clássicos de Drumond.

    O texto é uma narrativa do cotidiano e está na MPB com Paulo Diniz e outros intérpretes.

    Vale a pena ouvir. Vou te enviar com Paulo Diniz.

    Abraços do

    Vicente Almeida

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  2. Pois é...Vicente, além de ser um grande clássico, Paulo Diniz foi muito feliz em musicar. Aguardo o vídeo. Agradeço antecipadamente.
    Abraço de Fafá

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